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A infantilização profissional: o mercado treina adultos como estagiários eternos

O mercado de design vive uma contradição curiosa:

ele exige profissionais maduros, estratégicos, responsáveis e ao mesmo tempo treina esses mesmos profissionais como se fossem estagiários eternos.

É uma infantilização silenciosa, elegante, disfarçada de metodologia, boa prática ou “cultura leve”.

E quase ninguém percebe.


1. A pedagogia do raso

A infantilização começa no discurso da simplicidade exagerada. Tudo precisa ser fácil, rápido, “mastigado”, pronto para consumo imediato.

Designers deixam de pensar para apenas seguir:

— checklists

— frameworks pré-formatados

— prompts genéricos

— métodos sem contexto

O mercado cria operadores, não profissionais. E operadores são substituíveis.


2. A cultura do “não complica”

“Simplifica.”

“Vai direto ao ponto.”

“Não precisa pensar tanto.”

Essas frases parecem produtivas, mas constroem um problema mais profundo:

elas desestimulam complexidade. E complexidade é justamente o que forma maturidade. Quando você impede o profissional de lidar com problemas densos, você impede o profissional de amadurecer.


3. A grande mentira da autonomia

O mercado cobra “autonomia”, mas treina dependência. Tudo é passo a passo. Tudo é manual. Tudo é “faça assim”.

Autonomia não nasce de instrução. Nasce de raciocínio próprio. Mas raciocínio próprio é perigoso para estruturas que precisam que as pessoas funcionem como peças previsíveis.


4. A erosão da responsabilidade intelectual

Profissionais infantis delegam mentalidade. Querem que o mercado diga “como pensar”. Profissionais maduros assumem o incômodo de construir o próprio senso crítico.

Enquanto designers forem treinados para pedir permissão intelectual, vão continuar agindo como estagiários, só que com anos de experiência no currículo.


5. O que muda quando você abandona a infantilização

A carreira dobra. Literalmente.

Quando você abandona esse ciclo, três coisas acontecem:

  1. Você pensa antes de executar.
  2. Você questiona em vez de acatar.
  3. Você cria mais valor do que tarefas.

Profissionais maduros não são “melhores”. São raros. E raridade, no mercado, vale mais do que qualquer portfólio

Não existe carreira sólida construída sobre dependência cognitiva.

Se você quer amadurecer, precisa parar de aceitar que tratem você como aprendiz eterno.

A infantilização profissional é uma escolha. E quem escolhe lucidez, cresce.

Rafaella Ott
Rafaella Ott
http://rafaellaott.com.br
Rafaella Ott é designer e estrategista de produto. Atua onde design, negócio e cultura se encontram, transformando visão em estrutura, ideias em estratégia e design em liderança. Com uma trajetória que une prática e pensamento, Rafaella investiga como o design pode operar como força estratégica capaz de escalar times, amadurecer operações e gerar impacto real em produtos e organizações.

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